quinta-feira, 8 de março de 2012

Dia "da mulher" ou Dia de Luta pelos direitos da mulher?

Pensei em escrever algo sobre o Dia Internacional da Mulher motivado por algumas questões. Primeiro, porque um dos focos do meu trabalho no doutorado têm sido as relações de gênero, e estudo mulheres no pentecostalismo. Depois porque as chamadas comemorações do dia da mulher têm incomodado, a mim e a muita gente.


Curioso como sempre fui, dizem que uma característica do pesquisador é a curiosidade (então desde criança tento ser pesquisador), procurei entender o que significava o dia 8 de março, e porque um dia específico “dedicado” as mulheres.

Interessante que o “Dia da Mulher” começa como momento de luta. Ainda no século XVIII onde Olympe de Gouges, em 1791, lança a "Declaração dos Direitos da Cidadã", onde reivindicava o "direito feminino a todas as dignidades, lugares e empregos públicos segundo suas capacidades". Afirmava também que "se a mulher tem o direito de subir ao cadafalso, ela deve poder subir também à tribuna" (http://www.redemulher.org.br/8demarco.htm).

Já no século XIX, A Revolução Industrial levou a um aumento absurdo da jornada de trabalho e a luta pela redução desta jornada para 8 horas diárias passou a ser a grande bandeira de luta dos trabalhadores e trabalhadoras da indústria. Então em 1819, depois de um momento de enfrentamento e de violência policial, que chegou a usar canhões contra os trabalhadores e trabalhadoras, a Inglaterra chegou a aprovar uma lei que reduziria para 12 horas o trabalho das mulheres e dos menores entre 9 e 16 anos.

Mas a luta ainda não havia acabado só estava começando! Nos Estados Unidos, um grupo de tecelãs, na cidade de Nova Iorque, na busca de conquistas semelhantes a das companheiras inglesas, inicia uma série de manifestações pela redução da jornada de trabalho. São 129 tecelãs da Fábrica de Tecidos Cotton, elas cruzam os braços e param suas atividades pelo direito de trabalharem 10 horas diárias. É a primeira greve nos Estados Unidos que é conduzida unicamente por mulheres.

O resultado? Mulheres reprimidas com violência pela polícia, e para fugirem de tal ação descabida, se refugiam nas dependências da fábrica. Então no dia 8 de março de 1857, os empregadores e a polícia truculenta, fecham as portas da fábrica e ateiam fogo com as mulheres dentro. As tecelãs morrem asfixiadas e carbonizadas.

No Início do Século XX, uma ativista feminina (Clara Zetkin) propõe um dia para marcar mundialmente a luta pela conquista dos direitos da mulher, tendo como inspiração as tecelãs de Nova Iorque. É o início desta data que hoje “comemoramos”.

Mas relembro esta história para apenas trazer a tona o que motivou um dia internacional de luta pelo direito da mulher. Que foi transformado por uma sociedade consumista em DIA DA MULHER. Bem diferente a entonação: de Dia de LUTA, para o dia “da”.

Esta pequena mudança traz implicações ideológicas gravíssimas. Não se fala mais em luta, em conquistas, ou não se discute mais a exploração do trabalho feminino, ou a discriminação da mulher no mercado de trabalho, especialmente as profissões marcadas como “de mulher” (um erro histórico terrível). O Dia da Mulher é uma data comercial. Neste dia se entregam flores às mulheres (o mercado superfatura as rosas nesta semana), se sugere presentear às mulheres com joias, cestas de café da manhã e todos os tipos de bens de consumo. O dia de luta transformou-se em mais uma data comercial. É como o “dia da noiva”, uma data para comemorações não pelas conquistas sociais e luta por mais conquistas e direitos, mas um dia para se consumir. Lastimável!

“Parabéns Mulheres! Vocês estão ocupando os espaços antes exclusivos de homens, como os campos de futebol”. Esta foi uma das chamadas de uma rede de televisão nacional, para mostrar os “espaços” alcançados por mulheres. Por trás desta ocupação de espaço: mercado consumidor.

Confesso que esta abordagem deste dia me cansa, me desanima, me entristece. E tenho estes sentimentos, porque um grupo minoritário (homens), vem há séculos ditando o comportamento da maioria (isto é a falada ideologia), e consegue mudar o foco das lutas sociais.

É assim com o Dia de luta das mulheres, é assim com o direito à terra dos indígenas, com a Reforma Agrária, com a luta de quilombolas, com os trabalhadores, com grupos religiosos etc. Sempre transformando o que é motivo de reflexão e luta em algo banal. É o processo de banalização das lutas sociais. Ou quem sabe de idiotização do povo. Quanto mais idiota o povo, mais consumista, menos crítico, mais dócil, menos participativo.

Não sei sinceramente como me comportar neste dia. Se chego em um lugar com mulheres reunidas e não dou “feliz dia da Mulher”, sou chamado de insensível, de machista etc. Se me curvo a ideologia dominante masculina e dou parabéns, entrego flores, mando cartões virtuais com mensagens em Power Poit, estou indo de encontro a toda uma história de luta de milhões de mulheres que no silêncio de uma vida opressa, lutaram para que hoje pudéssemos refletir sobre isso.

Diante da minha incerteza, “Eu fico com a pureza das respostas das crianças: É a vida! É bonita e é bonita! Viver e não ter a vergonha de ser feliz” (Gonzaguinha).

Abraços a todas e a todos vocês, mulheres homens que ainda acreditam que com a luta, a reflexão e a participação popular podem mudar atitudes, comportamentos, homens e mulheres.

Abaixo um vídeo que gostei muito e compartilho com vocês.

@Zerominho

Um comentário:

Anônimo disse...

Romulo,partilho com vc a indignação sobre a data, simplesmente, voltada para o comercio, esquecendo-se do seu surgimento onde mulheres morreram em luta por melhores condiçoes de trabalho............no mais é bom ser lembrada sempre, nesta data especificamente ( seu amigo nao lembra de nada!!) Então vamos pensar como gonzaguinha. bj Val